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sexta-feira, 8 de agosto de 2014

AMOR QUE É MESMO AMOR

(Cronica da Flash)
O melhor de amar alguém é ter a capacidade de mostrar como e o quanto amamos o outro. Amar não é só proteger o outro, ouvi-o e ajuda-lo, dar-lhe colo quando está carente e espaço quando precisa de ar; amar o outro está nos mais pequenos gestos, e por isso subscrevo Oscar Wilde quando diz que não há coisas nem grandes nem pequenas, todas são importantes.
Uma história de amor, para ser vivida a sério, precisa de ser alimentada todos os dias. Senão, não é amor, é outra coisa qualquer. Até pode ser uma grande paixão, regada a violentas doses de testosterona e de adrenalina, mas se o outro não estiver lá todos os dias para nós e nós para ele, não é uma história de amor. É um caso, uma aventura, um lance, como se diz no Brasil.
Um lance é um lance, um romance é um romance. Mesmo que duas pessoas não possam estar juntas todos os dias porque não vivem na mesma cidade ou trabalham em turnos diferentes, o amor obriga a que se telefonem e comuniquem sempre que podem, porque o amor é prioritário. E se um dia deixa de ser, então já não é amor. Pode ser companhia, encosto, conforto, preguiça de mudar, medo da solidão, mas já não é amor.
O amor é como um tsunami: inesperado, invasivo e letal. Quando nos apanha na curva, podemos fazer apenas uma de três coisas: fingir que não é nada connosco, baixar a cabeça e seguir em frente, recuar e resistir, ou abrir-lhe os braços e dizer: ok, vamos a isto.
Claro que nunca na vida é tão linear quanto parece: há quem corra atrás, faça tudo para conquistar o outro e depois entre em crise, há quem fuja à velocidade certa para ser apanhado quando quer e há quem fique quieto, sem se mexer, incrédulo e estupefacto, à espera que o outro faça um gesto profundamente dramático a ponto de nos fazer acreditar que é mesmo verdade. Nessa curva tão terna e lancinante em que o amor começa – e afinal tão parecida com a mesma curva terna e lancinante descrita por Alexandre o’Neill em Um Adeus Português que vai ser que já é o teu desaparecimento – quando amor acaba, é preciso saber respirar fundo e encarar a grande mudança que se aproxima com dignidade, elegância e respeito, porque existem apenas duas realidades que o Homem não controla: o Amor e a Morte.
Por amor, há quem mude de bairro, de cidade ou de país, há quem mude de emprego ou de casa. Porém, antes das mudanças exteriores, é necessário tempo e espaço para que o caos provocado por uma nova realidade se re-organize. O amor modifica-nos muito mais imaginamos. Por vezes, só alguns anos mais tarde nos apercebemos o que aprendemos com alguém que amámos e nos amou profundamente. O amor é ao mesmo tempo uma linguagem e uma aprendizagem, na qual a energia flui de formas tão evidentes quanto subtis, da cabeça aos pés, da razão ao coração, do consciente ao inconsciente, do passado ao futuro, vivido no presente a cada minuto, sem nos dar descanso ao mesmo tempo que nele encontramos toda a paz que precisamos. É o que nos faz adormecer a acordar sem nunca baixar os braços e a forma mais pura e difícil de respirar.
Um grande amor é como uma revolução: tudo muda de repente e depois demoramos muito tempo ajustar-nos à nova realidade. E quando ganhamos outra visão do mundo, precisamos de coragem para abolir a maneira antiga como víamos as coisas e adaptarmo-nos à nova vida que escolhemos. Se há cidades que mudam de nome e lugares onde nunca mais poderemos voltar, também há novas pontes por construir. E o futuro deixa de ser uma quimera para se tornar naquilo que queremos fazer dele. Dá trabalho, mete medo, mas se for mesmo amor, vale a pena. E se não for, morre pelo caminho.

MRP

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